Para algumas crianças, ir para a escola é um ato de coragem. As quatro horas que separam o espaço entre o sinal da entrada e o da saída são preenchidas por provocações, exclusão e tormento. A dor que se sente, nem sempre se vê, pois ela é abafada por um denso véu de silêncio. O bullying dói, e é necessário falar sobre ele. A união de pais e professores no combate ao problema é um fator indispensável para a mudança.
Entenda mais sobre o assunto:
O que é bullying?
Bullying é o termo que descreve uma série de atos de violência física ou psicológica que uma ou mais pessoas infligem à outra repetidamente ao longo do tempo, causando sofrimento. Para quem o experimenta, no entanto, a descrição pode ser bem mais simples: é um inferno.
Esse tormento, vivenciado por milhões de pessoas ao longo da história, sobretudo estudantes, ganhou nome na década de 70, quando o psicólogo e pesquisador sueco Dan Olweus publicou o primeiro estudo sobre o assunto, sob o título Aggression in the schools: Bullies and whipping BOYS (Agressão nas escolas: valentões e chicotadas).
A expressão bullying é uma derivação da palavra inglesa bully, que quer dizer “valentão”, “brigão”, “tirano”, uma referência a quem pratica o ato. Embora o problema seja bastante antigo, a popularização do termo no Brasil é relativamente recente, tendo menos de duas décadas.
O que motiva o bullying?
O psicólogo Paulo Otávio Andrade, que também é mestre na área, explica que nas ciências humanas não é possível definir uma causa exata para o fenômeno. Há porém, estudos e pontos de vista.
Se o motivo for procurado com a vítima da prática, ela provavelmente atribuirá o fato a algo inerente a ela, como a aparência, a religião ou alguma outra característica. No entanto, estudos mostram que há uma correlação muito forte entre a prática do bullying e a violência dentro da família do praticante.
“Ele consegue ver, vivenciar casos de violência dentro da casa dele, que acabam se refletindo nele”, esclarece Andrade. O profissional diz que essa correspondência é uma das mais fortes encontradas hoje na psicologia.
Como o bullying afeta quem o recebe?
O bullying pode ter um impacto catastrófico na vítima. Conforme Andrade, diversos sintomas começam a se manifestar nela, e a gravidade aumenta em estágios de curto, médio e longo prazo.
O psicólogo explica que a criança começa a se desmotivar a ir para a escola, a se sentir isolada, melancólica, não circular mais pelos espaços, ter diminuição da autoestima e da autoconfiança, perda de apetite, e isso pode evoluir para uma patologia mais séria, como a depressão. Ela, por sua vez, pode trazer consequências extremas, como o suicídio.
O desfecho trágico é o resultado de um percurso, muitas vezes, silencioso. A criança pode tentar disfarçar e fingir que nada está acontecendo. No entanto, a mudança em seu comportamento é brusca, pois a energia que as crianças costumam manifestar some. “Ela vai perdendo o ímpeto pela vida”, conclui Andrade.
Também é possível que a vítima de bullying comece a desenvolver um comportamento agressivo, violento, como uma forma de defesa daquela situação que ela está vivendo. Alguns casos podem resultar em situações realmente críticas. Nos Estados Unidos, situações que acabam de modo fatídico já são uma epidemia. Um dos exemplos mais notórios foi o que aconteceu na Columbine High School, no estado do Colorado, e foi retratado no documentário “Tiros em Columbine”.
Todas essas situações desconstroem a ideia de que o bullying é uma “brincadeira inofensiva”, incapaz de grandes danos. Os fatos provam que o problema é grave e as consequências podem ser terríveis, ou até trágicas.
O que a escola pode fazer para combater o bullying?
As instituições de ensino têm nas mãos um poder muito grande de combate à prática do bullying, pois elas são o cenário aonde ele normalmente ocorre. “É muito importante que a escola não ignore o bullying”, enfatiza o psicólogo Andrade. Ele diz que a situação não ocorre somente entre crianças isoladas. Existe um espaço, um contorno, que atravessa toda essa relação também. Nesse local, há professores e outros profissionais capacitados que podem agir para combater a prática.
Andrade recomenda que sejam criados espaços de encontros, tanto para a vítima quanto para a criança ou adolescente que comete o ato. Esses espaços podem ser, por exemplo, competições esportivas; grupos de trabalhos montados pelos professores, aonde as crianças são colocadas em equipes diferentes das que elas interagem normalmente, e outras situações que estimulem o convívio colaborativo e não permitam o isolamento.
“A pessoa que sofre a violência tende a se isolar, se excluir, ficar retraída, e o profissional que está lá envolta pode buscar essa criança e ajudá-la a fortalecer as defesas psíquicas. Ele pode influenciar a atitude do bullying, conversar com os dois e ver o que está acontecendo”, afirma.
Da mesma forma, a criança que pratica o bullying também precisa de atenção. “Partindo do pressuposto de que quem comete bullying sofre violência em casa, também há a necessidade desses espaços de amor, conforto e compaixão”, enfatiza o psicólogo. O profissional destaca que o papel da escola é tecer redes, e essas redes são com outras pessoas e as coisas prazerosas da vida.
Além dos espaços físicos
Nem todas as interações que ocorrem entre os alunos são em espaços físicos. Eles conversam também pela internet, e são nesses momentos que ocorre o cyberbullying. Uma forma de a escola lidar com o problema é dando aos alunos um canal para que possam interagir, mas com monitoramento.
Em espaços assim, comentários reconhecidos como bullying podem ser censurados, e como o número do celular dos alunos não fica visível, isso impede que eles sejam chamados para conversas privadas fora do canal. Observar o que está acontecendo também dá à escola a oportunidade de identificar os casos de violência que ainda não foram percebidos e tomar uma atitude.
Conforme destaca o psicólogo Andrade, quem assiste à violência tem um espaço de intervenção muito grande e muito poderoso na situação. “O bullying tem sempre três pessoas envolvidas: a que pratica, a que sofre e a que assiste. A pessoa que assiste pode ter dois movimentos, incentivá-lo ou intervir nele. Quando não tem a risadinha, o reforço, o praticante não se sente estimulado a continuar”, esclarece.
Assim, com o monitoramento, a escola pode exercer essa função de intervenção, protegendo a criança e apagando conversas maldosas antes que elas se intensifiquem. Os alunos conscientes dos males do bullying também podem agir para atrapalhar a situação.
De acordo com Andrade, tratar a criança que pratica bullying com corretivos e punições agressivas não é recomendado. “Parece bobo, mas a violência se combate com amor e afeto. Quem pratica a violência reproduz os encontros que teve ao longo da vida”, garante. O psicólogo explica que é importante haver disciplina, mas sem violência. Os pais podem explicar os limites para as crianças; a diferença entre o certo e o errado; punir se necessário, mas sem agressividade; conscientizá-la sobre o mal que o bullying faz e como ele prejudica o coleguinha; e principalmente, exercitar na criança a empatia, fazendo com que ela tente se colocar no lugar do outro e imaginar o que ele sente. Estimular no filho sentimentos opostos aos provocados pelo bullying é o melhor caminho para os pais de quem sofre a violência, conforme salienta Andrade. “A primeira coisa que o pai tem que fazer é mostrar que ele não está sozinho. Verificar os pontos que estão fazendo-o se sentir mal e resignificar isso”, instrui. De acordo com o psicólogo, a criança que sofre bullying tende a expandir isso para outros lugares. Ela acredita que o que acontece na escola vai se repetir em atividades esportivas, artísticas, no cinema, no parque e em qualquer lugar aonde ela for. É importante mostrar que isso não é uma verdade, e colocá-la em outras atividades fora da escola, para que ela possa se comunicar e interagir com outras pessoas. Isso a fortalecerá gradualmente. “Quando a criança é colocada em uma situação de bullying, é algo aversivo para ela, e os mecanismos básicos do cérebro são luta ou fuga. Mas existe também essa terceira via, que é a do fortalecimento”, explica. Além da criação de novos espaços para a criança “circular”, para que ela possa fortalecer as defesas, Andrade recomenda que os pais se façam presentes na vida dela; não a reprimam por estar sofrendo bullying; e não estimulem que ela “dê o troco”, batendo no coleguinha. A união entre pais e professores é um fator essencial no combate ao bullying. Afinal, a criança passa uma parte do dia com a família e outra com a escola, e essas duas instituições possuem informações diferentes sobre ela. “Quando pais e professores se juntam, acontece basicamente o que eu chamo de “criar redes”, aonde você consegue ter uma visão mais completa da criança, obtendo informações melhores e mais precisas sobre o que está se passando”, esclarece Andrade. Para o psicólogo, conseguir enxergar esses movimentos é essencial para a criação de estratégias de enfrentamento ao problema. Um bom canal de comunicação entre pais e professores se torna um grande aliado nesses casos. É importante também que se saiba o que buscar. Conforme Andrade, o bullying não é só algo explícito, e pequenas atitudes também devem ser observadas. “Se todo dia quando você passar eu e os meus amigos dermos uma risadinha, ou a gente sempre chamar todo mundo para lanchar e não te chamar, isso também é uma forma de violência. E é claro que a pessoa que está nessa posição de isolamento vai se sentir retraída, e isso já vai começando a abalar a forma como ela raciocina o mundo”, explica. O psicólogo reforça a importância de haver uma comunicação prática e fácil entre pais e escola para o combate ao bullying. “Não é fácil para o pai sair do trabalho correndo porque ele acha que a criança está triste. Mas quando há uma dinâmica assim, ele pode conversar com a escola e ela já conseguirá dar os primeiros passos para tentar enxergar possíveis casos de violência”, afirma. O combate ao bullying é um processo, e embora não haja uma fórmula mágica para resolvê-lo, há ferramentas que podem te ajudar no enfrentamento da situação. A ClipEscola é uma plataforma completa de comunicação entre pais e escola. A solução, que funciona por meio de aplicativo instalado no celular, permite que família e instituição de ensino interajam com rapidez e qualidade, podendo se unir na observação de situações de bullying e sintomas apresentados pelas vítimas. O aplicativo permite também a interação monitorada entre alunos, possibilitando à escola apagar conversas identificadas como bullying, não permitindo assim que a situação avance. O número de celular dos estudantes não aparece na ferramenta, o que impede que as conversas sigam para algum outro canal fora do alcance da escola. Saiba mais sobre a ferramenta por aqui.
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O que os pais podem fazer?
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É importante haver diálogo entre pais e professores?
Há alguma ferramenta que possa ajudar?
– A importância da participação da família na rotina escolar
– Informar todos os responsáveis é missão da instituição de ensino
O que a sua escola está fazendo hoje para enfrentar o bullying? Se precisar de ajuda com relação à parte de comunicação escolar, pode contar com a gente!